Qual a cor do teu céu?

O filme Vermelho Como o Céu de Cristiano Bortone, inicia com a apresentação da vida cotidiana do personagem principal, Mirco Mencacci. Ele morava com seus pais em uma vila da Toscana, Itália. Desde cedo, por incentivo do pai, se interessou pelo cinema. Tornando-se um renomado compositor e editor de som do cinema italiano.

A reviravolta sobre a qual se desenvolve o filme ocorre quando Mirco, por curiosidade, brincava com uma velha espingarda e se assusta com a voz do pai, provocando assim uma queda da cadeira e o consequente disparo da arma ao atingir o chão. Mirco é atingido principalmente nos olhos, causando sua cegueira. Após recomendações, os pais de Mirco decidem levá-lo para estudar em um colégio de Educação Especial, já que na época as escolas públicas não aceitavam alunos com deficiência.

O filme é fabuloso, e apresenta a história de um garoto determinado, capaz de enfrentar sua nova situação, e limitações, de aprender com seus pares (como no caso do som do vento junto à janela), e de influenciar os que estão ao seu redor devido a sua criatividade, como no caso do trabalho sobre as estações, gravado e editado a partir de sua obstinação e capacidade autodidata de manipular o gravador.

O garoto é dotado de percepção aguçada; por ser assim, tem destaque na escola e em suas atividades na comunidade; como toda criança, gosta das atividades que preencham sua sede natural de descobertas, neste caso o cinema.

Quando somos permanentemente privados de alguma capacidade, nos vemos desesperados de conseguir viver normalmente no mundo, quando Mirco se sentiu privado do gravador que “roubara”, adoeceu, se retraiu, se isolou. Uma nova “revolta”, perder mais uma capacidade de vivenciar…, Don Giulio foi procurá-lo e, ao perceber que ele se escondia ali perto, iniciou uma “conversa” consigo mesmo, fingindo acreditar que o menino não estivesse por lá. Demonstrando entendimento da realidade e da subjetividade do garoto importantes para conduzir e restabelecê-lo.

Qual a relação entre o filme relatado e a educação?

A escola sempre foi colocada como a principal estimuladora da percepção. Ficamos em alguns momentos, negligenciando a infinidade de alternativas pedagógicas que podemos lançar mão para aprimorar o aprendizado. Assim como nos fixamos na visão como a maior “porta de entrada” de informações.

O paradigma da inclusão vem ao longo dos anos, buscando a não exclusão escolar e propondo ações que garantam o acesso e permanência do aluno com deficiência no ensino regular. No entanto, o paradigma da segregação é forte e enraizado nas escolas, que com todas as dificuldades e desafios a enfrentar, acabam por reforçar o desejo de mantê-los em espaços especializados.

O adjetivo ”inclusivo” é usado quando se busca qualidade para todas as pessoas com ou sem deficiência. Para falar sobre inclusão escolar é preciso repensar o sentido que se está atribuindo à educação, além de atualizar nossas concepções e ressignificar o processo de construção de todo o indivíduo, compreendendo a complexidade e amplitude que envolve essa temática. Fala-se muito que a inclusão é sinônimo de igualdade, quando na verdade o que a sociedade precisa é de equidade. Não desejamos que os sujeitos sejam tratados da mesma maneira, queremos ser vistos de forma justa e respeitosa. Contudo a inclusão coloca inúmeros questionamentos aos professores e técnicos que atuam nessa área.

Outro aspecto a ser considerado é o papel do professor, pois é difícil repensar sobre o que estamos habituados a fazer, além do mais a escola tradicional está estruturada para trabalhar com a homogeneidade e nunca com a diversidade. Esta é outra situação bem representada pelas personagens que exercem o papel de diretor e professor no filme. Enquanto o primeiro insiste em permanecer estagnado numa cultura ultrapassada que pensa a educação como forma de treino para vida adulta, o professor apresenta sua reflexão inquietante frente às necessidades dos estudantes em terem sua singularidade atendida.

As cenas em Vermelho como o Céu, estão carregadas de significantes, que brincam com a nossa capacidade cognitiva. José Pacheco (2008) fala que, mais de trinta anos de prática numa “sala de aula” diferente, fizeram com que visse a “realidade” com diferentes olhares. Acreditando que, algum dia, os professores hão de compreender por que razão, para certos modos de ver, o céu pode ser vermelho.

Que continuemos a ter céus de todas as cores, que signifiquem nosso modo de pensar e agir, possibilitando as distintas contribuições que cada sujeito proporciona a sociedade.

 

Simone Marcelino Bergental

Coordenadora Pedagógica da Yellow